Roberto Camilo*
Publicitário e empresário com especialização em Governança Corporativa pela Leland Standord Junior University.

O debate sobre serviço público é antigo. Já aconteceu em governos anteriores, teve um embate direto durante a Reforma da Previdência, foi acentuado pela expectativa da reforma administrativa e ganhou protagonismo, recentemente, durante a pandemia, por se tratar de um grupo que possui estabilidade em um período em que grande parte da população está sofrendo com redução de renda.

Para que seja válido e aproveitável esse debate, precisamos falar de serviço público sem o corporativismo no que tange à sua defesa cega e por outro lado, não podemos entrar no discurso de ódio que se alastra muitas vezes com origem dentro dos gabinetes de seus próprios empregadores no Executivo Federal.

Sinto-me confortável para falar sobre o assunto por transitar diretamente nas duas áreas: pública e privada. Para isso, preciso destacar que passei toda a minha vida na área privada e nos últimos seis anos tornei-me prestador de serviços para instituições que congregam serviços públicos nas esferas municipal, estadual e federal. Não apenas atendo, mas acompanho a rotina de mais de 450 mil servidores, sendo 250 mil do serviço público federal, com os mais variados salários e áreas de atuação.

As duas primeiras coisas que pensamos quando falamos de serviço público são: ineficiência e altos salários. Precisamos separar o joio do trigo. Serviço público não é sinônimo de servidor público. Já trabalhei em empresas nas quais não concordava com a gestão, forma de atuar e que, por fim, não me deram condições de desempenhar um bom trabalho. Você já foi mal atendido por um servidor? Eu já. Mas na iniciativa privada isso também ocorre. Tente cancelar sua assinatura de TV a cabo, por exemplo.

Outro fato que muitas vezes é ignorado é da classificação de um grupo tão heterogêneo como se fosse exatamente a mesma coisa. Tivemos casos como o de uma magistrada de Pernambuco que recebeu mais de R$1,2 milhão em vencimentos em um só mês no ano passado. Isso acontece. Uma aberração inconstitucional e que deve gerar um posicionamento incisivo da população. Mas não se pode balizar um grupo de 12 milhões de pessoas por casos isolados. Quanto ganha um gari? Quanto ganha um professor da rede pública? Quanto ganha um técnico em enfermagem no SUS? São todos servidores e não podemos colocá-los dentro da mesma categoria do caso da juíza quando discutirmos o assunto. É injusto e cruel.

No meio da pirâmide salarial do funcionalismo público, temos os grandes carregadores de piano. São advogados públicos, defensores, servidores da Receita Federal, Policiais Federais, auditores, analistas, técnicos, servidores do Comércio Exterior, entre tantos outros. Cargos que precisam ser devidamente colocados como fundamentais, estratégicos e de linha de frente para o desenvolvimento do país. Ignorar isso é enterrar o futuro do Brasil. Profissionais de qualidade e com a obrigações acima da média são baratos, seja na iniciativa pública ou privada.

A discussão sobre salários iniciais exagerados e progressões sendo aplicadas de forma muito rápidas precisam ser discutidas. Na área privada, um ótimo profissional quando se forma ganha no máximo R$ 4.000,00 num grande escritório, jamais R$ 25.000,00, como em algumas carreiras em atividade. Isso deve ser previsto na Reforma Administrativa e trazido para a realidade do país que vivemos. No entanto, não acho – e você também não deveria achar – um absurdo que um profissional qualificado evolua e ganhe muito bem por isso no decorrer de sua carreira.

Sem querer filosofar sobre Bauman e a Modernidade Líquida, é necessário citar que no tempo dos nossos pais, o sonho deles era entrar em uma empresa, ter estabilidade, comprar uma casa, casar-se, criar os filhos com dignidade e se aposentar. Como conquistar e manter um talento na iniciativa pública, capaz de ajudar a construir um país melhor sem que ele tenha perspectiva de crescimento pessoal e profissional na carreira? Qual o objetivo de investir em capacitação de um profissional que amanhã poderá ir embora para a iniciativa privada?

Outro detalhe que passa despercebido da população é sobre o verdadeiro salário do serviço público. Este ano o servidor público já teve redução salarial. A partir do início da vigência da nova previdência no primeiro semestre, somados os descontos de Imposto de Renda, o servidor público passou a ter uma alíquota total de 41% de desconto real em seu salário bruto. Dito isso, vamos imaginar um servidor que ganhe o dobro da média nacional de R$ 4.000,00, que seria R$ 8.000,00 mensais. Esse servidor, ao passar no concurso, teria que sair de sua cidade para mudar com a família para Brasília. Logo na saída, com os abatimentos de 41%, o salário líquido desse profissional seria de R$ 4.720,00.

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