Na linha de frente do combate ao novo coronavírus, estão os servidores públicos das mais diferentes áreas, especialmente os da saúde. Antes, éramos um peso para a sociedade, um estorvo. Os algozes estão refugiados nas suas mansões, acovardados e talvez arrependidos.

Augusto Cecílio* / Jornal do Commercio (AM)
10/04/2020

Realmente o mundo dá muitas voltas. Quem diria? Hoje, na linha de frente do enfrentamento ao coronavírus, não vemos engravatados, banqueiros nem o pessoal do chamado mercado financeiro. Não vemos nenhum daqueles que tentaram jogar na lama a imagem daqueles que trabalham para servir ao público, aí incluída parcela da mídia e seus espaços generosos pra divulgar matérias e reportagens contra os servidores e até contra os serviços públicos.

Na linha de frente, estão os servidores públicos das mais diversas áreas, especialmente os da saúde, que arriscam as suas vidas e a dos seus familiares para salvar vidas, além dos que estão na retaguarda trabalhando para manter a máquina pública funcionando.

Que ironia! Os que foram recentemente chamados de “parasitas”  são a nossa esperança. Antes, fomos acusados de tudo, éramos um peso para a sociedade, um estorvo, um grupo que trabalhava pouco, um bando de preguiçosos que ganhava muito e que consumia os recursos que deveriam ir, imagino, para o pagamento dos juros absurdos da dívida pública e para os financiadores e defensores do chamado neoliberalismo e do Estado mínimo.

Como disse Paulo Planet Buarque, em artigo publicado. “De repente, não mais que de repente, todos os problemas brasileiros — seu eterno déficit público, a corrupção, a sonegação fiscal, a injusta distribuição de renda, a incompetência administrativa, tudo —  passaram a ter no servidor público a sua causa principal, senão única”.

“Toda a mídia concentrou no servidor público a razão maior dos males nacionais,  sendo as reformas administrativa e previdenciária absolutamente imperiosas: eis que, a partir da aprovação das mesmas, por fim os governos passarão a ter os recursos indispensáveis para o investimento e o desenvolvimento”. 

 Bem antes do episódio dos “parasitas”, fomos bombardeados por reformas e pela possibilidade de redução de salário, pelo possível esvaziamento dos serviços públicos, além de discursos difamatórios, que jogaram a sociedade contra nós. A mesma sociedade que luta hoje contra a falta de leitos, de respiradores, máscaras, álcool, teste rápidos e de materiais de proteção para os profissionais de saúde.

Antes mesmo das eleições presidenciais, chegaram até a classificar como “jabuticabas brasileiras” o direito ao 13º salário e ao abono de férias. E outros insistem em defender patrões existentes em outros países, inclusive os EUA, que não oferecem saúde pública à população e onde o simples teste do coronavírus custa o equivalente a R$ 5 mil.

Diante das mortes e das infecções, temos mais uma certeza: a necessidade urgente de se valorizar o SUS (Sistema Único de Saúde) e os serviços públicos. Como disse Élcio Marcelino, do SindSaúde-SP, mesmo sucateado, tendo perdido mais de R$  20 bilhões para o pagamento de juros só no ano passado, o SUS ainda consegue oferecer tratamento para a população.

“Se não fosse o SUS e seus trabalhadores, a situação seria muito pior no Brasil. Muito pior que a da Itália e da Espanha, onde a gente vê as pessoas sendo internadas em casa, e os médicos sendo obrigados a escolher quem vai viver e quem vai morrer para colocar no respirador”.

É neste momento que a sociedade verá a importância dos servidores, verdadeiros protagonistas nessa luta, heróis anônimos que se arriscam, enquanto os nossos algozes estão refugiados nas suas mansões, acovardados e talvez arrependidos. 

* auditor fiscal e professor

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